Depois de algum tempo de busca espiritual, nos deparamos com o Natal em sua divina-humanidade. Cada vez que nos debruçamos a entender o que há de divino no Natal, encontramos nele a humanidade.
Trata-se da história de um homem que se manifesta em sua completa finitude, em sua mais pura humanidade. Aquele que é o centro das opulentas atrações natalinas nasceu pobre, mendigo, forasteiro e desamparado.
O que há de divino nisso? Nada, se considerarmos como divino algo sobrenatural. Diariamente nascem milhares de crianças em circunstâncias parecidas e até piores. O menino que hoje celebramos não veio para ser um monarca poderoso, com muitos bens e reinos, veio para ser servo, humilde e simples.
O Deus Cristão é o Deus-Homem, humano, finito. Este Deus se fez o menor de todos, se fez frágil, pequeno... se fez menino...
Um menino como qualquer outro, que sentiu fome e chorou, que mamou, que teve todas as necessidades de qualquer pessoa, que perdeu seus dentinhos de leite. O Deus que ali nasceu não trouxe nada do que o paganismo reservava aos seus deuses, não era majestoso, não estava acima de nada, não era orgulhoso nem invejoso. Estava acima somente de algumas palhas num cocho destinado a alimentar animais. Brincava como qualquer criança, se sujava de lama, atrapalhava o pai na marcenaria... era criança...
A divindade ali nascida veio manifestar a humanidade, foi humano em todos os seus atos. Sentiu exatamente tudo que sentimos, foi impactado e vivenciou nossas emoções aflitivas. Sentiu raiva quando expulsou os vendilhões do templo (mesmo assim os vendilhões continuam se espalhando), sentiu apego e chorou quando seu amigo Lázaro morreu. Foi tentado a ser orgulhoso e a ter inveja, mas por quarenta dias jejuou e se purificou de todos os venenos da mente. Jesus foi homem e ser humano diz possuir os 5 venenos da mente e lidar com eles. Cristo-Homem viveu estes venenos e os superou.
Em sua existência conosco manifestou uma das principais virtudes por nós conhecida, a generosidade. Cristo é manifestação pura de generosidade, manifestação que não é diferente de amor-compaixão. Foi generoso ao nascer como humano. Foi generoso ao entregar-se a nós como um de nós. Foi generoso quando pouco possuiu. Foi generoso quando muito amou.
Generosidade diz a capacidade de acolher a todos, a capacidade de dar e de receber, a capacidade de reconhecer o outro enquanto tal. Cristo-homem ensinou muito de humanidade, amou a humanidade até o fim, e foi extremamente generoso ao entregar-se.
O que conseguimos manter do que ensinou o Homem-Cristo? Muito pouco! Transformamos o Natal num emaranhado de símbolos, um emaranhando de luzes, um tanto de bolinhas coloridas, uma imensidão de presentes, tudo isso permeado de um pieguismo romântico-emotivo.
Não aprendemos o essencial, a generosidade de nosso Deus. Hoje, vivemos o universo do apego às muitas coisas e tratamos a generosidade como uma doação que surge das sobras. Damos aos outros o que não nos serve mais. Ao invés de sermos generosos, usamos o outro como um solucionador de nossos problemas, oferecemos a ele aquilo que ao nosso ver já não estaria mais conosco e agora só ocupa espaço. Muitas vezes, doamos algumas coisas não pela intenção pura de beneficiar os outros, mas com a necessidade de pessoal de apaziguar nossas crises de consciência. Doamos como alguém que possui e está acima, oferecendo algo a quem está abaixo. Este tipo de doação não é expressão de generosidade, pois a manifestação de Cristo não divide uns dos outros. Em Cristo não há distinção, em Cristo todos são um. A manifestação de Cristo no Natal tem a ver com a generosidade de acolher a todos, sem distinções.
A generosidade de Cristo diz dar exatamente daquilo que se tem e que faz falta. A generosidade de Cristo diz dar a vida, entregar-se. A generosidade que nos é apresentada pelo Cristo nos mostra que pouco é necessário, e que este pouco necessário que possuímos é possível repartir e que ao repartimos todos serão beneficiados.
Após alguns anos de prática budista, foi possível se tornar mais cristão. Pelo exemplo de Cristo e sua vida-ensinamento é possível desenvolver amor, compaixão, equanimidade e alegria. O exemplo de Cristo faz com que, em reconhecendo o outro em sua essência, sejamos capazes de nutrir amor por todos, sejam eles quem forem, sem qualquer distinção.
Que neste Natal sejamos impactados pela virtude da generosidade e possamos acolher a todos, sem exceção, reconhecendo em todos a mais pura manifestação da divina-humanidade manifestada pelo menino do presépio.
Feliz Natal!
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